António Esteves

A vila de Pardilhó, encostada à Ria de Aveiro, tem uma longa história ligada à construção naval. Aqui foram construídos muitos dos barcos moliceiros que navegavam pela Ria de Aveiro na apanha do moliço, uma alga aquática usada para fertilizar os terrenos agrícolas da região. No início da década de 1950, existiam sete estaleiros de carpintaria naval em plena atividade nesta pequena freguesia do concelho de Estarreja. Foi num desses estaleiros que António Esteves começou a trabalhar quando tinha apenas 10 anos.

Como aprendiz do Mestre Henrique Lavoura, nome grande da história da construção de embarcações tradicionais da Ria de Aveiro, António começou por aprender a manejar o machado e a enxó, cortando as madeiras de pinheiro bravo e manso criteriosamente escolhidas pelo seu mestre. Tendo revelado, desde muito cedo, uma grande aptidão para a carpintaria naval, António já fazia “os trabalhos mais difíceis” aos 16 anos. “O mestre mandava-me ‘pontear’ o barco, que é remendar os bordos atrás e à frente”, diz, recordando que participou na construção de muitos moliceiros, mercantéis e bateiras até aos 32 anos, altura em que foi convidado por um primo para trabalhar nos Estados Unidos.

Mais de 20 anos depois de ter começado a trabalhar no estaleiro do Mestre Lavoura, António deixou Pardilhó em busca do sonho americano. No outro lado do oceano, em New Jersey, continuou a construir barcos, mas desta vez em fibra de vidro. “Andei lá 20 anos a fazer modelos de iates em fibra de vidro”, conta, acrescentando que chegou a encarregado de uma “companhia que chegava a fazer dezassete iates por dia”. Porém, não obstante o sucesso profissional e o bem-estar económico, António nunca deixou de pensar no regresso a Portugal para fazer o que mais gosta: moliceiros. Assim, em 1993, duas décadas após ter deixado Pardilhó, António regressou à sua terra natal para construir o seu próprio estaleiro naval.

Tendo partido como carpinteiro naval, António Esteves regressou como especialista em fibra de vidro, o que abriu a porta a novas oportunidades de negócio. Após “4 anos a lutar contra a capitania” para obter autorização para construir lanchas em fibra de vidro, quis o destino que o seu antigo mestre, Henrique Lavoura, lhe pedisse para fazer um moliceiro, visto que o seu estado de saúde já não lhe permitia fazê-lo. Mesmo tendo finalmente conseguido a tão esperada autorização, António Esteves optou por se dedicar à sua grande paixão. “Depois desse moliceiro, recebi a encomenda de outro moliceiro que acabou por vencer a Grande Regata dos Moliceiros da Ria de Aveiro”, recorda António Esteves. A partir daí, as encomendas sucederam-se, tendo já feito mais de vinte moliceiros desde que regressou a Pardilhó. Apesar do desaparecimento da atividade para a qual foram concebidos – a apanha do moliço –, os moliceiros ganharam nova vida graças à atividade turística nos canais da cidade de Aveiro. O último moliceiro construído no estaleiro do Mestre António Esteves foi “O Presidente”, cujo “bota-abaixo” (lançamento à água) teve lugar no Cais do Bico, na Murtosa. As encomendas de embarcações tradicionais em madeira, porém, não são em número suficiente para satisfazer a vontade de trabalhar de António Esteves. Prestes a completar 81 anos, começa a trabalhar às sete da manhã e nunca sai do estaleiro antes das cinco da tarde. À falta de moliceiros para construir, o Mestre António Esteves dedica-se à construção e reparação de bateiras em madeira e fibra de vidro, as duas matérias-primas que moldam a sua carreira de sete décadas como construtor naval.

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